domingo, 29 de novembro de 2009

Instantes de Um Peregrino Sem Fé

13. Amizade


Percorri os caminhos labirínticos do jardim. Havia muitos bancos vazios. Saltitei de banco em banco. Havia sempre um motivozinho para escolher outro banco. Por fim, sentei-me num banco, de frente para a Biblioteca Municipal. Perto de mim, três adolescentes comportavam-se como crianças. Um pouco mais afastados, dois idosos comportavam-se como mortos. Ocupei-me a observar um grupo de pombos que, aos poucos, começaram a aproximar-se de mim. Sussurrei-lhes
(eu não tenho nada para vos oferecer).
Repensei o meu sussurro e emendei-o
(a não ser a minha companhia, a minha amizade, o meu tempo).
Um dos pombos, ou seria uma pomba?, agitou as asas, deu um impulso ao seu frágil corpo e pulou para o meu pé direito, que se encontrava cruzado sobre o esquerdo. E ficámos algum tempo a admirar-nos, a travar amizade, até que a minha mais recente amiga resolveu partir.
[Os amigos partem. Mas a amizade fica.]

2 comentários:

  1. ...e uma ave sabendo bem qual é o pé que não a pisa, escolhe-o para poisar...
    M.Barbeitos

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  2. Ausência
    Num deserto sem água
    Numa noite sem lua
    Num país sem nome
    Ou numa terra nua
    Por maior que seja o desespero
    Nenhuma ausência é mais funda do que a tua.

    Sophia de Mello Breyner

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