domingo, 31 de janeiro de 2010

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Ipsis Verbis



«Deve ser possível, penso eu, viver plenamente a vida em setenta horas como em setenta anos...»

«Gosto de ti porque consigo ler no teu coração. E quando dizes que mentes, não são mentiras importantes.»
             Ernest Hemingwai, Por quem os sinos dobram

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Algarve, ano de 1996
Início de noite,
de sábado,
quando um poeta mergulhava nas profundezas
da solidão.
Quão absurda era ou é a vida!
um homem só a fazer crer a homens sós que não estão sós.
Rádio Lagoa (ainda emite?)
Older, excelente.
Escutá-lo-ei
até haver noite e palavras ansiosas por vida.




domingo, 17 de janeiro de 2010

Granito & Água - Parte IV





Itinerário de Um Peregrino Sem Fé

17. Bairro Alto


Jantei num restaurante em Alcântara onde a ASAE teria muito que bisbilhotar. Era noite de sábado. No final do jantar, subi a pé até à Lapa onde ficaria alojado essa noite. Pelas ruas deparei-me com um silêncio estranho, inesperado - um silêncio de aldeia. Era possível escutar as minhas vozes mais profundas. Uma brisa subia do rio e massajava-me a pele.
Uma voz amiga

(estamos em Lisboa… É sábado… Bairro Alto).
Fiz o que todos fazem, em rebanho, no Bairro Alto. Itinerei de rua em rua, de bar em bar, de música em música, de bebida em bebida, de conversa em conversa, de observação em observação, vi e, talvez, tenha sido visto.
A noite já ia adiantada quando regressei à casa desconhecida para tentar o que não consegui: dormir três ou quatro horas. Fiquei acordado a acalmar o mesmo vazio que levara dentro de mim ao início da noite.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Ipsis Verbis



«Ligar o amor à sexualidade foi realmente uma das ideias mais bizarras do criador.»

«Mas o frágil edifício do amor deles desmoronar-se-ia imediatamente porque esse edifício repousava sobre o pilar único da sua fidelidade e os amores são como os impérios: desaparecendo a ideia sobre a qual estão construídos, também eles desaparecem.»

«Nos dias que correm, quem apaga a luz para fazer amor arrisca-se a cair no ridículo; como ele tem consciência disso, deixa sempre uma luzinha acesa por cima da cama. No entanto, no momento em que penetra em Sabina, fecha os olhos.»


«Para um amor se tornar inesquecível é preciso que, desde o primeiro momento, os acasos se reúnam nele como os pássaros nos ombros de São Francisco de Assis.»


«A partir de então, ambos sentiam antecipadamente um grande prazer na partilha do sono. Sinto-me quase tentado a dizer que o que procuravam no acto sexual não era a volúpia mas o sono que se lhe segue.»

    Milan Kundera, A Insustentável Leveza do Ser
                        

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Instantes de Um Peregrino Sem Fé

16. Miradouro da Graça



Nunca gostei de cidades despovoadas, como se fossem gigantescos cemitérios com mausoléus multiformes e multicolores. As ruas de Lisboa encontravam-se praticamente desertas de lisboetas. E os turistas eram mais silenciosos e menos apreçados. A pressa torna-nos incivilizados.
Subi as ruas íngremes e estreitas até ao Miradouro. Não me cruzei com carros, com buzinas, com impropérios dos condutores para outros condutores, com pessoas a desviarem-se furtivamente de outros sem-tempo-a-perder.
[O tempo gasta-se. Não se ganha.]
Havia muitos turistas no Miradouro da Graça. Falava-se inglês e português de várias regiões. As esplanadas estavam a empanturradas de pessoas a conversar, a beber, a ouvir, a ler, a olhar, a observar, a ser observada, a pensar, a tentar fazer tudo isso. Eu fui uma das últimas. Eu fui também uma das que ficou melancólica com o lento definhar da capital, um retrato das cidades antigas deste país sentado a ver ruir o passado, enquanto o fino, perdão, a imperial, não aquece. Lisboa envelhece sem dignidade.
Do miradouro da Graça, avistei uma cidade de costas voltadas para o passado e às apalpadelas ao futuro.




 

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Granito & Água - Parte II


RECEITA DE ANO NOVO

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)

Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumidas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de Janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.

 
Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.


Carlos Drummond de Andrade